A ARTE DA DESAPARIÇÃO
Jean Baudrillard


Assim é a simulação, naquilo em que se contrapõe à representação. Esta parte do princípio de equivalência do signo e do real (mesmo se essa equivalência é utópica) é um axioma fundamental. A simulação parte, ao contrário da utopia, do princípio de equivalência, parte da negação radical do signo como valor, parte do signo como reversão e aniquilamento de toda a referência. Enquanto que a representação tenta absorver a simulação interpretando-a como falsa representação, a simulação envolve todo o edifício da representação como simulacro.

Seriam estas as fases sucessivas da imagem:
· Ela é o reflexo de uma realidade profunda;
· Ela mascara e deforma uma realidade profunda;
· Ela mascara a ausência de realidade profunda;
· Ela não tem relação com qualquer realidade: ela é o seu próprio simulacro puro.

No primeiro caso, a imagem é uma boa aparência – a representação é do domínio do sacramento. No segundo, é uma aparência – do domínio do malefício. No terceiro, finge ser uma aparência – é do domínio do sortilégio. No quarto, já não é de todo do domínio da aparência, mas da simulação.

A passagem dos signos que dissimulam alguma coisa aos signos que dissimulam que não há nada marca a curva decisiva. Os primeiros referem-se a uma teologia da verdade e do segredo (de que faz ainda parte a ideologia). Os segundos inauguram a era dos simulacros e da simulação, onde já não existe Deus para reconhecer os seus, onde já não existe Juízo Final para separar o falso do verdadeiro, o real da sua ressurreição artificial, pois tudo já está de antemão morto e ressuscitado.

Quando o real já não é o que era, a nostalgia assume todo o seu sentido. Sobrevalorização dos mitos de origem e dos signos de realidade. Sobrevalorização de verdade, de objetividade e de autenticidade de segundo plano. Escalada do verdadeiro, do vivido, ressurreição do figurativo onde o objeto e a substância desaparecem. Produção desenfreada de real e de referencial, paralela e superior ao desenfreamento da produção material: assim surge a simulação na fase que nos interessa – uma estratégia de real, de neo-real e de hiper-real, que faz por todo o lado a dublagem de uma estratégia de dissuasão.



BAUDRILLARD, Jean. A Arte da Desaparição. Páginas 28 e 29. Rio de Janeiro: Editora UFRJ, 1997.

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