AGORA VOCÊ OUVIRÁ!
AGORA VOCÊ OUVIRÁ!
AGORA VOCÊ OUVIRÁ!
Por Henrique Saidel
Adentrando o mundo das telecomunicações, a Companhia Silenciosa apresenta, in loco, “Agora Você Ouvirá!”. Espetáculo da palavra, no qual apenas uma atriz e um espectador se comunicam por vez. De 22 a 25 de março, não vá ao teatro, vá ao telefone e disque (41)322-3080 ou (41)323-2727. Do meio-dia às 15 horas, 10 minutos por ligação. Disque teatro e ouça com atenção. A ligação não é gratuita.
UM – Generalidades

Comunicar. Desejo e necessidade básica da vida em sociedade. Transmissão de idéias, pensamentos, emoções. Contato, ponto de encontro, sinapse. Expandir os limites do pensamento, lançando-o adiante, adiante de si, em direção do outro. Compreensão, auto-compreensão, mão dupla. Alienar-se no curso fluído da linguagem, correnteza, meio de transporte, o que sai daqui, o que chega lá. Equívocos, incompreensões, interpretações. O que sai daqui, o que chega lá. A normatização da linguagem, a convenção que permite o entendimento, parco entendimento, limitação. O pensamento, que se pretende transmitido, é gerado e modelado tolhido pelas perniciosas cercas da convenção. A oferta escrava da demanda. O pensamento desinteressado, potente, vivo, avassalador é suprimido, comprimido e extrusado sob a forma de linguagem, as arestas ignoradas. A palavra. Que se impõe como meio de transporte par excellence do pensamento e da emoção. Perversa, principal responsável pela comunicação, pela propagação das idéias, pelos contatos sinapses, principal responsável pelo adestramento corrupção do pensamento emoção. O meio de transporte torna-se o próprio transportado. A palavra é a palavra. A palavra traz a palavra. A comunicação é a palavra. Preponderante hegemônico veículo a palavra se dá enquanto idéia. A palavra se dá em poesia. A incapacidade de vazar todos os sentidos transforma-se em beleza, em dinâmica, em vida. Vida enclausurada, mas vida. E ao conferir ao indizível a qualidade de indizível, realça-lhe a força, a negação agiganta o negado. O indizível surge, ressurge, incomensurável real. Graças à palavra. Tensão, fricção, eletricidade, pólos opostos da pilha. A comunicação acende-se na palavra e no indizível, mão dupla sem sinalização não se pode reduzir a velocidade.
Teatro. Ator texto espectador. Um espaço uma presença duas presenças comunicação. Um faz outro vê, outro faz um vê. Ver o que acontece no espaço, ver-se no espaço. Ser o espaço. O espaço é veículo do transporte entre. O que vê e o que faz, o espaço é o transportado. Texto não é só palavra é espaço. A palavra é o espaço. Espaço é uma palavra. Conflito, onde se dá o embate dizível e não dizível, onde se estabelece a comunicação. O espaço limita as idéias emoções ações, a palavra limita as idéias emoções ações, as idéias emoções ações delimitadas são propagadas. As idéias emoções ações sobrevivem em poesia. O conflito, o confronto é a poesia do teatro. O teatro é a poesia do confronto, real indizível. Emergido da palavra e de outras e tantas convenções da linguagem. Caótico, poético, dinâmico, vivo. O espaço não é físico o espaço é cênico. O que liga o um ao outro não importa fixamente, o que liga é o confronto. A presença é denunciada pelo indizível, pelo real. O ver, o escutar, o ver-se, o escutar-se. O teatro é o meio de transporte que comunica, o teatro é o comunicado.


DOIS – Especificidades

Comunicação. Teatro. A Companhia Silenciosa oferece ao público o espetáculo Agora Você Ouvirá!, com encenação de Henrique Saidel. Espetáculo da palavra, pura e simples, se é que é possível que a palavra seja pura e simples. O texto falado em seu sentido mais amplo estabelece-se comunicação. O texto palavra direta secreta íntima intima. Um único atuante, palavras únicas, a voz como corpo carne. Um único espectador, ouvidos únicos, a voz como carne crua. O contato, a sinapse em Agora Você Ouvirá! se dá entre uma atriz e um espectador por vez, sessão máxima de 10 minutos. A ligação é pessoal, individual mas não direta. Há um intermediário, uma rede de intermediários. Que permitem facilitam expandem porém seqüestram virtualizam descarnam a comunicação. Telefone. Telecomunicação. O affair entre atuante e espectador se dá via telefone. O público não vai a um teatro ou outro local específico, o público recebe um número de telefone para o qual disca. O espaço não é físico o espaço é cênico. O confronto se estabelece dentro do cabo que liga um aparelho ao outro. A pergunta: onde está a presença física do atuante? A resposta: na outra ponta da linha. A voz como corpo carne, a respiração, os sons, as palavras. Dizível e indizível. 10 minutos de contato direto indireto. A sós. Os textos, ensaiados e não, pré-escritos e não. Sim à poesia da palavra sim à palavra poesia. A pergunta: um elenco de quatro se só uma por vez? A resposta: cada ligação uma surpresa, cada chamada uma atriz um instante, serviço telefônico. Disque teatro. A ligação não é gratuita. O espectador dá o primeiro passo, o dedo no discador, ativo, atuante, confrontante. A atriz recebe o telefonema, alô, passiva na obrigação da ação, dialética de atuação. A pergunta:
É só isso? A resposta: não. Agora Você Ouvirá! oferece uma segunda versão de seus atos. A visão. O número divulgado é o número do telefone público também revelado ao espectador. Não contente em telefonar em participar ativamente, o público vê as atrizes ao aparelho, visão por detrás, making of. Maquiagem, figurino, cenário. Para não contrariar, para enriquecer, para provocar a. A pergunta: e se todos só verem e não telefonarem? A resposta: azar, mas todos serão avisados incitados a. Agora.

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